Uma análise sobre o marketing de causas

Posicionar-se. Tomar partido em torno de uma pauta social. Em tempos de discussões afloradas – e amplificadas por meio das redes sociais – em que, muitas vezes, pessoas recorrem a extremos, defender ou prestar suporte a uma causa pode parecer um risco, sobretudo para empresas que, afinal de contas, dependem dos consumidores para existir.

Mas, ao contrário do que uma primeira visão mais apressada poderia supor, pesquisas demonstram que, quando bem estruturadas, alinhadas com os valores de uma marca e verdadeiras, campanhas que tem como base o marketing de causas podem trazer resultados extremamente positivos.

Para abordar este tema, separei alguns estudos interessantes levando em conta tanto os benefícios que companhias podem extrair através de ações mais engajadas, quanto os obstáculos que elas precisam superar para que estas mesmas ações tenham potencial de sucesso e passem uma mensagem clara e sem ruídos para o seu público-alvo.

O propósito social do Marketing

De início, é válido estabelecermos um breve conceito do Marketing de Causas. De modo geral, podemos defini-lo como a relação entre o apoio ou contribuição de uma empresa sobre uma determinada pauta, visando causar impacto em seu público-alvo e estabelecer um vínculo com os consumidores por meio da transparência e compartilhamento de valores.

O Marketing de Causas está diretamente ligado a ideia de propósito social, de que marcas podem e devem participar dos debates públicos e, para além disso, que elas são capazes de contribuir de modo significativo com a melhora da vida em sociedade, tudo isso, claro, sem perder de vista o viés mercadológico e do fortalecimento de companhias em seus respectivos segmentos de atuação.

É por isso que, quando falamos de ações como o projeto Bike Sampa do Itaú ou do patrocínio do Bradesco Seguros para as ciclofaixas paulistanas, temos um caso que une o Marketing Social (por promover o bem-estar) com o Marketing de Causas (por estar ligado a pautas fundamentais como a mobilidade urbana e melhor relação com o meio ambiente).

Levando em conta estes pontos, podemos dizer que uma empresa que implementa estratégias de marketing engajado de modo bem estruturado vai ainda além do exposto no artigo 20 do Conar:

Nenhum anúncio deve favorecer ou estimular qualquer espécie de ofensa ou discriminação racial, social, política, religiosa ou de nacionalidade.

Os benefícios do engajamento em causas sociais

Mas, e do ponto de vista da geração de negócios, que, afinal de contas, é o propósito principal do marketing enquanto área de atuação, o engajamento em causas pode trazer resultados positivos? Alguns números relevantes demonstram que sim.

Segundo pesquisa do Ibope, por exemplo, mais de 60% dos consumidores estaria disposto a trocar as marcas que consomem por outras comprometidas com melhorias em sua cidade ou que promovam ações de cultura, bem-estar e lazer. Outro dado interessante da mesma pesquisa aponta que 50% dos entrevistados aceitaria pagar um valor mais alto por marcas compromissadas com tais ações de melhoria.

A ligação de afetividade entre empresas comprometidas e consumidores também é demonstrada na pesquisa, com um em cada quatro participantes afirmando sentir admiração por marcas com esse grau de comprometimento.

Pensando agora no viés da interação nas redes sociais, o que percebo é que, campanhas com propósito e estrutura bem definidas podem alcançar resultados impressionantes. Podemos citar, por exemplo, dois cases que ganharam repercussão nas redes sociais.

O primeiro caso é da marca de moda íntima Tulli Me, que alcançou mais de 2K interações na divulgação de seu catálogo no Facebook, baseado na ideia de trabalhar com mulheres de diferentes perfis, ao invés de modelos profissionais, e não utilizar programas de edição de imagens nas fotos. A ideia é totalmente coerente com o propósito da marca de oferecer produtos “em prol do conforto, do empoderamento feminino e dos direitos das mulheres.”

O segundo caso, ainda mais impactante, consiste no trabalho de reformulação estratégica das campanhas da Skol, visando o retrabalho na imagem da marca e a inserção dela em questões como a inclusão social e o combate ao preconceito. Uma das campanhas de maior sucesso alcançou quase 60 mil interações no Facebook:

 “Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”, os desafios das campanhas socialmente engajadas

Mas o Marketing de Causas é uma opção estratégica que contém uma série de exigências. Especialistas do mercado apontam três pilares centrais que devem ser encarados e construídos pelas marcas que desejam optar pela rota das campanhas engajadas: propósito, tempo e consistência.

O propósito diz respeito ao já comentado alinhamento entre os objetivos das campanhas e os valores da marca. O tempo se refere ao fato de que estratégias de marketing de causas levam tempo para causar repercussão e, de modo geral, devem ser contínuas, uma vez que estamos falando de valores que devem se comunicar os próprios valores de uma empresa.

Por fim, quando falamos de consistência, nos referimos a capacidade, não só de criar campanhas bem estruturadas, claras e eficientes, mas, sobretudo, de se manter fiel a estratégia. Não adianta, por exemplo, defender uma pauta e abandoná-la de modo repentino. Isso só gerará ruídos na comunicação e pode impactar negativamente na credibilidade da marca.

Para concluir, gostaria de encerrar com dois pontos. O primeiro já demos a dica, mas sempre vale reforçar: só faz sentido para uma marca dar suporte a uma pauta social por meio de uma campanha de marketing, quando aquela causa se relaciona, realmente, com os valores da empresa (ou com um novo direcionamento de mercado, como no caso da Skol). Do contrário, a impressão que fica é que a companhia está ‘surfando’ em uma tendência ou mesmo se apropriando, indevidamente, de uma pauta que não é abraçada por ela, de fato.

E o segundo ponto, por sua vez, tem relação com algo que comentei logo no início do texto: em tempos de debates acirrados, a impressão que fica é que todos nós, empresas e indivíduos, precisamos, obrigatoriamente, nos posicionar publicamente. Mas a verdade é que não precisamos. Aliás, mesmo quando uma empresa não faz uso do marketing de causas, isso não quer dizer que ela não seja simpática a esta ou aquela causa. Assumir uma pauta, entretanto, é uma escolha, e não uma obrigação, e uma campanha de marketing, por sua vez, pode ser excelente, mesmo sem entrar em questões polêmicas – e vice-versa. O importante aqui é a sinceridade de propósito e a certeza de que, independentemente das estratégias que adotemos, teremos desafios pela frente que precisarão ser enfrentados com competência e respeito ao nosso público-alvo.

*Com mais de 15 anos de experiência na área de Marketing e atuação em projetos de Ativação, Relacionamento, Live Marketing e Gestão de Negócios em agências de comunicação, o executivo atuou em grandes empresas do mercado, como: SKY Brasil, Fiat e Aktuellmix.

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