“A sopa de Maria” estreia no Palacete das Artes

Ação do projeto “Tropicália: Régua e Compasso”, realizado pela Funceb, IPAC e FPC, promove bate-papo sobre “A Bahia cultural pré-tropicalismo”. Ingresso gratuito

“Gil, hoje não tem sopa na varanda de Maria”, escreveu Caetano Veloso na contracapa do disco com seu nome, gravado em 1967, e que ficaria na história da MPB como o primeiro registro fonográfico tropicalista. O cantor e compositor santamarense fazia menção à residência de Maria Moniz, no Jardim Baiano, em Nazaré, Salvador, onde jovens artistas e intelectuais se encontravam nos anos 1960. A ambiência daquele período pré Tropicalismo inspira a ação A Sopa de Maria, que terá estreia no dia 20.12, terça-feira, às 17h, na área externa do Palacete das Artes. A atriz Maria Moniz comanda esta primeira edição da programação gratuita, parte do projeto Tropicália: Régua e Compasso (A Bahia Cultural Pré-Tropicalista).

A ideia é promover o encontro de jovens artistas, estudantes, pessoas interessadas em conhecer um pouco mais sobre a ambiência artística e cultural vivida pelos  jovens tropicalistas quando ainda transitavam pela cidade, em meados dos anos 60. Nessa época, a atriz Maria Moniz levava uma animada e cheia de assunto turma para cantar, conversar, recitar, namorar e sorver uma deliciosa sopa na varanda de sua casa, no Jardim Baiano, em Nazaré.

A jornalista e atriz Maria Moniz (do filme O Caipora), hoje funcionária da Funceb, lotada na Diretoria de Audiovisual (Dimas), recebia amigos na residência construída em 1934 pelo pintor Presciliano Silva, seu pai. Já nos anos 30, 40 e 50 o imóvel era cenário para encontros, saraus, festas juninas e de Natal que aglutinavam pensadores do país e de fora do país. Filha do artista visual e de Alice Moniz Silva, Maria passou a organizar encontros com colegas da Escola de Teatro e da Escola de Dança da Ufba. Nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Maria Bethânia, Orlando Sena, Glauber Rocha, Tom Zé e Helena Ignês mostravam o apreço pela Bossa Nova em noites musicais.

Com bate-papo descontraído, reunindo como atração nomes do período de efervescência cultural anterior ao movimento musical, a cada edição A Sopa de Maria irá acontecer com uma sopa sendo feita pelo público. As próximas edições acontecerão nos dias 10 e 24.01, 7 e 14.02, 14 e 28.03. Esta é uma das ações paralelas à exposição montada na Sala Contemporânea Mario Cravo Jr do Palacete.

Exposição – A mostra conta com peças de artistas da música, da dança, e das artes visuais em evidência nos anos 60, como Lina Bo Bardi, Walter Smetack, Yanka Rudzka, Carybé, Juarez Paraíso, Lênio Braga, Jenner Augusto, Pierre Verger, além de fotos dos acervos de Lia e Silvio Robatto, recentemente doados ao Centro de Memória da Bahia.

Até 30 de março de 2017, ano de comemoração dos 50 anos da Tropicália, a exposição com curadoria de Murilo Ribeiro, diretor do Palacete, fica montada para visitação, inspirando ações paralelas. Tropicália: Régua e compasso é idealizado por Fernanda Tourinho, diretora da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb), que realiza o projeto com o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC) – ao qual pertence o Palacete das Artes -, e com a Fundação Pedro Calmon (FPC), entidades vinculadas à Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SecultBA). 

Caetano Veloso – Texto de contracapa do disco Caetano Veloso

“Que maravilhoso país o nosso, onde se pode contratar quarenta músicos para tocar ‘um’ uníssono.

(Miles Davis, durante uma gravação)

Antes havia Orlando Silva & flautas e até mesmo no meio do meio dia. Antes havia os prados e os bosques na gravura dos meus olhos. Antes de ontem o céu estava muito azul e eu e ela passamos por baixo desse céu, ao mesmo tempo com medo dos cachorros e sem muita pressa de chegar do lado de lá. Do lado de cá não resta quase ninguém. Apenas os sapatos polidos refletem os automóveis que, por sua vez, polidos, refletem os sapatos assim per omnia até que (por absoluta falta de vento) tudo sobe num redemoinho leve, me deixando entrever um resto de rosto ou outro, pedaços, amém. Marina sabe a história do pelicano etc. etc. o peito aberto e rasgado etc. etc. mas que nada: quando a gente não tem nenhuma necessidade de ir para os States não há mesmo mais esperança. Eu gostaria de fazer uma canção de protestos de estima e consideração, mas essa língua portuguesa me deixa rouco. Os acordes dissonantes já não bastam para cobrir nossas vergonhas, nossa nudez transatlântica. E, no entanto, Ele é um gênio: quem ousaria dedicar este disco a João Gilberto? Quantos anos você tem? Como é que você se chama, quando é que você me ama, onde é que vamos morar? Os automóveis parecem voar, os automóveis parecem voar por cima (mas mais alto que o Caravelle) dos telhados azuis de Lisboa, dos teus olhos, dos mais incríveis umbigos de todas as mulheres em transe, dos teus cabelos cortados mais curtos que os meus, meu amor, porque eu não quero, porque eu não devo explicar absolutamente nada.

P.S.: Gil, hoje não tem sopa na varanda de Maria.

Caetano Veloso” 

Serviço:

Tropicália: Régua e Compasso

Exposição: Mostra foca ambiência anterior ao movimento musical, reunido peças de Lina Bo Bardi, Smetak, Rudzka, Carybé, Juarez Paraíso, Lênio Braga, Jenner Augusto, Verger e acervo de Lia e Silvio Robatto. Visitação: De terças às sextas-feiras, das 13 às 19h; sábados, domingos e feriados, das 14 às 19h.

Programação até março, às terças, quartas e quintas-feiras sempre a partir das 17h:

A Sopa de Maria: Terças-feiras: 20/12, 10 e 24/01, 7 e 14/02, 14 e 28/03
Uma Ideia na Cabeça: Quarta-feiras, até 30/03
Essa Noite se Improvisa: Quintas-feiras: 5 e 19/01, 09/02, 23 e 28/03
Seminário e lançamento de revista: dias 29 e 30/03

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